Regulamentado pela Resolução nº 455/2022 do Conselho Nacional de Justiça-CNJ, em conformidade com o artigo 246 do Código de Processo Civil, o Domicílio Judicial Eletrônico-DJE representa uma mudança na forma como as comunicações processuais como citações, intimações e outras notificações são realizadas nacionalmente, centralizando e unificando em uma única plataforma digital, todas as comunicações enviadas pelos tribunais brasileiros, substituindo os métodos tradicionais, como cartas com aviso de recebimento e oficiais de justiça.
Principais pontos de operacionalidade
1 – Cadastro obrigatório: obrigatoriedade do cadastro para todas as pessoas jurídicas (de direito público e privado), com exceção de microempresas e empresas de pequeno porte que possuem endereço eletrônico no sistema integrado da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios-Redesim e facultativo para pessoas físicas, com prazo inicial para o cadastro de grandes e médias empresas encerrou-se em 30 de maio de 2024, que pode acarretar sanções as empresas que não realizaram o cadastro.
2 – Centralização das comunicações: o DJE funciona como uma caixa de entrada unificada de todos tribunais do país (com exceção do Supremo Tribunal Federal), que enviam suas comunicações processuais para este portal, eliminando a necessidade de monitorar múltiplos sistemas judiciais estaduais e federais, simplificando a gestão processual.
3 – Prazos e leitura tácita: este é o ponto de atenção quanto à operacionalidade do DJE, que após o envio de uma citação ou intimação para o DJE, o destinatário tem prazos específicos para realizar a leitura:
* 3 dias úteis para ler uma citação
* 10 dias corridos para ler uma intimação
Se a leitura não for feita dentro desses prazos, o sistema considera a comunicação como automaticamente realizada (leitura tácita) ao término do prazo. A partir desse momento, os prazos processuais começam a correr, independentemente de o destinatário ter efetivamente aberto a mensagem. Essa automação exige um monitoramento constante da plataforma.
4 – Consequências da inércia: a falta de cadastro ou o não acompanhamento do DJE implica em riscos para empresa não cadastrada que pode ser citada por edital ou outros meios, sendo que o processo seguirá à sua revelia. Para as cadastradas, a não leitura de uma intimação pode levar à perda de um prazo para apresentar defesa, recurso ou cumprir uma ordem judicial, que pode resultar em prejuízos financeiros e jurídicos.
A responsabilidade civil do contabilista e o impacto do DJE
À primeira vista, o DJE parece ser uma ferramenta de responsabilidade exclusiva do departamento jurídico, entretanto, sua natureza e as consequências de sua gestão criam paralelo com a responsabilidade civil do contabilista, conforme artigos 1.177 e 1.178 do Código Civil e normas do Conselho Federal de Contabilidade (CFC).
A responsabilidade civil do contabilista tem início quando, por ação ou omissão culposa (negligência, imprudência ou imperícia), causa danos a seus clientes ou a terceiros, onde a legislação estabelece que o contabilista é pessoalmente responsável pelos atos que pratica e, solidariamente com o cliente, pelos atos culposos que resultem em prejuízo.
Destacamos que não é de responsabilidade do contabilista o acesso ao DJE, salvo se estiver em contrato de trabalho ou contrato de prestação de serviço.
Esquematizando a responsabilidade em seus três principais aspectos:
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Domicílio Judicial Eletrônico |
Responsabilidade civil do contabilista |
Natureza da Obrigação |
Obrigação de meio: a empresa e seus gestores tem o dever de monitorar a plataforma para que nenhuma comunicação seja perdida, viabilizando o direito de defesa. |
Obrigação de meio: o contabilista deve aplicar seu conhecimento técnico com diligência para manter a regularidade fiscal e contábil do cliente. |
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Risco da Omissão |
A omissão na consulta ao DJE resulta na perda de prazos processuais, levando à revelia e a decisões judiciais desfavoráveis com repercussão jurídica e econômica. |
A omissão do contabilista, por exemplo, ao não entregar uma declaração ou cometer um erro na apuração de um tributo resultam, em ambos os casos, em multas, juros e autuações fiscais. |
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Culpa por Negligência
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A negligência é a principal fonte de riscos com o DJE e falta de acompanhamento devido a processo interno de monitoramento ou delegação desta tarefa a alguém sem o devido treinamento configuram atos de negligência. |
A negligência aplicada ao contabilista é configurada com a ausência de entrega de uma obrigação acessória, por exemplo, que ocasiona a responsabilidade civil. |
Convergência na prática diária
A conexão entre os dois temas se torna mais visível em empresas de pequeno e médio porte, onde o contabilista atua como o principal conselheiro de gestão e executor das obrigações legais e fiscais, ressaltando que a responsabilidade pelo DJE é do administrador da empresa, é comum que o cliente busque o auxílio do seu contabilista para entender e gerenciar essa nova obrigação.
Nesse cenário, o contabilista assume a responsabilidade, ainda que não prevista em contrato de prestação de serviço, de orientar ou monitorar o DJE para seu cliente, assumindo os riscos em reparar no caso de dano por ausência de acompanhamento do DJE, podendo configurar uma falha na prestação de serviço e consequente ação de indenização contra o contabilista.
Conclusão
O Domicílio Judicial Eletrônico é uma ferramenta de modernização que transfere grande responsabilidade para o jurisdicionado (empresa) ou a quem vier assumir esse ônus (contabilista) e sua gestão e operacionalidade exige uma disciplina rigorosa para acompanhamento.
Essa nova realidade cria um paralelo direto com a responsabilidade civil do contabilista. Ambos os domínios são regidos por uma ética da vigilância a obrigação de monitorar prazos, cumprir deveres e agir com diligência para prevenir danos. A omissão e a negligência, quer seja com a caixa de entrada judicial ou em uma apuração de impostos, levam a um mesmo resultado: um prejuízo financeiro e evitável, pelo qual o responsável, seja o administrador da empresa ou seu contabilista podem ser chamados a responderem, enfatizando que esta responsabilidade não é do contabilista, salvo previsão em contrato de trabalho ou contrato de prestação de serviços.
Henri Paganini – Consultor Tributário do Sindcont-SP
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